Por Oscar Filho do CQC
Oscar Filho |
Quando era criança, eu era extremamente mimado e chato em relação a comida. Ficava fazendo firula para comer o que tinha no prato além de choramingar quando eu não queria comer algo que fosse servido pra mim.
Sabe a criança que diz que não gosta de determinado alimento e quando é questionado se já comeu, ela diz que não? Pois é, eu era bem desse tipo: não gostava do que eu nunca tinha provado.
Muitas vezes sobrava muita comida no meu prato justamente por ser muito fresquinho.
Aos domingos, meu pai sempre levava minha irmã e eu para dar uma volta. Fosse num parque, numa sorveteria, andar de carro, ver as paisagens…
Num desses domingos meu pai me disse que iria me levar pra passear. Mas só a mim, minha irmã não iria junto.
Entrei no carro e ele começou a guiar para um lugar longe, bem distante da cidade.
Era tão longe que eu fiquei com um certo medo. Era um lugar que não havia muitas casas, era estrada de terra e as poucas pessoas que eu via pareciam bastante pobres. Logo me dei conta que estavamos indo para o lixão da minha cidade.
Meu pai parou o fusca azul, desligou o carro, olhou pro relógio de pulso e falou:
- Já deve estar quase no horário…
Eram dez e pouco da manhã quando eu vi o caminhão de lixo chegar. Ele disse:
- Eu quero que você apenas observe o que vai acontecer.
E eu observei… Muitas pessoas, principalmente crianças, correram para debaixo do caminhão justamente no momento em que ele descarregava o lixo. Elas se empurravam a fim de conseguir o máximo de “comida” que encontravam ali.
Algumas pessoas, principalmente crianças, além de segurar, comiam alguns resíduos ali mesmo tamanha a fome que mostravam sentir.
Não durou muito tempo… O caminhão foi embora e tudo o que parecia estar fresco, na concepção deles, levaram para, provavelmente, a casa deles.
Aquela situação me fez chorar. Não foi um choro compulsivo, desses que nos fazem soluçar. Foi um choro de um ser humano que entende alguma coisa dentro de si e que não sabe exatamente o que é, mas certamente um dia saberá.
Mesmo assim, meu pai me disse:
- Essas crianças são pobres. Elas não tem o que comer. Por isso elas dependem do lixo que é jogado aqui. Consegue imaginar o cheiro disso?
Eu não respondi, mas eu imaginava sim. Imaginava porque eu podia sentir o cheiro dali mesmo estando a certa distância daquelas crianças.
Sem esperar minha resposta, continuou:
- Consegue imaginar o gosto disso que eles estão comendo?
Isso eu não sabia, mas dava para imaginar.
- Pense um pouco, meu filho: sua mãe faz uma comida gostosa. Ela te serve quentinha. É uma comida saudável. Graças a Deus nós temos condições de dar isso pra você e pra sua irmã. Da próxima vez que a sua mãe te servir, tente se lembrar dessa cena que você acabou de ver. Com tanta gente com fome no mundo e você com frescura pra comer. Entendeu?
Mais uma vez eu não respondi. Eu, simplesmente, não consegui.
Meu pai ligou o carro, deu a volta e fomos pra casa. Durante todo o caminho fui com o coração bastante apertado. Aquela cena realmente foi muito forte pra mim.
Hoje eu não lembro dessa história porque lembrar sugere que um dia eu esqueci, e essa história, para mim, é impossível esquecer. Ela é tão forte que a sensação do coração apertado que eu tive quando ia pra casa naquela época com uns 7 ou 8 anos de idade é bastante parecida com essa que eu estou sentindo escrevendo isso agora.
Foto da época: meu pai, minha irmã Vivian, eu e uma amiga dela (de azul) |
Fonte: Blog do Oscar Filho
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